Ser Assistente Social é primeiramente ser #FORABOLSONARO

Por  Eunice Suelen da Hora, Thais Gonzaga e Vanessa Brito
(Assistentes Sociais da TamoJuntas)

 

 

Ser Assistente Social é primeiramente ser #FORABOLSONARO
É ser feminista, antirracista, antifascista. É lutar por uma sociedade mais justa e menos desigual
É enxergar a vida de cada pessoa humana, se encontrar nas histórias ouvidas
É respeitar a subjetividade de cada indivíduo buscando sempre personalizar os atendimentos e
compreender as necessidades apresentadas de cada um.
É se reinventar a cada nova demanda, saindo da zona de conforto para desvendar as mais variadas
alternativas e possibilidades de intervenção.

Ser Assistente Social nada mais é que ser um sujeito ético.
É ter como base da sua atuação o conhecimento teórico e metodológico para intervir nas questões
sociais.

É ter o entendimento do código de ética que regulamenta a profissão.
É combater as desigualdades, trabalhando na garantia de direitos fundamentais das pessoas em
vulnerabilidade social.
É buscar sempre uma forma acolhedora de enfrentar as dificuldades

8 de março de 2021: o luto e a luta das mulheres

Por Leticia Dias Ferreira *

 

Chegamos a este 8 de março de 2021, somando mais de 260 mil mortos pela COVID-19. Para nós, o 8 de março nunca foi uma data de flores e homenagens. É um dia de luta, dia que ocupamos as ruas clamando por nossas vidas, por dignidade, justiça e direitos.

Em 2021, o sentimento inafastável é de luto,  consternação e igualmente de revolta, pois as mulheres estão sofrendo de forma atroz as consequências de um governo que dissemina a doença e a miséria.   A pandemia tem nos levado a uma desumana sobrecarga, pois estamos majoritariamente em atividades profissionais de cuidado e no trabalho doméstico e de reprodução da vida, no qual continuamos invisibilizadas.  A violência dentro de nossos lares se impôs ainda mais cruelmente com o isolamento social, escancarando que a casa continua sendo o local mais perigoso para as mulheres. A miséria, o desemprego, a retirada dos direitos sociais recai sobre nós, mulheres, de forma mais gravosa. A violência do Estado, o desmonte de políticas públicas e o retrocesso democrático tem colocado em risco nossas existências de forma brutal.

É importante lembrar que a luta das mulheres atravessa os séculos por melhores condições de vida, pelo fim da exploração e discriminação prospectando um horizonte ético-político de liberdade, justiça e equidade. Estamos percorrendo um trajeto alicerçado pelas que vieram antes de nós na luta pela autonomia e contra a sujeição de nossos corpos e mentes ao cis-heteropatriarcado racista. Nossa prática política é construir cotidianamente esse devir onde a exploração e a submissão não sejam mais naturalizadas, mas combatidas.  Para nós, o empoderamento é um processo coletivo de tomada de poder. Não nos interessa que algumas mulheres tenham poder em detrimento da exploração de outras. Não nos interessa um poder que não está comprometido com as mulheres em suas singularidades nem com a superação das desigualdades. A luta feminista está comprometida radicalmente com a luta antirracista, anti-capitalista e com a democracia.

Assim, neste 8 de março reafirmamos nosso compromisso com a luta política das mulheres; denunciando as atrocidades deste governo  e enfrentando os nossos algozes com  voz altiva e punhos em riste. Às nossas companheiras mortas nem um minuto de silêncio, mas toda uma vida de luta!

Fora Bolsonaro e Mourão!
Pelo IMPEACHMENT do governo inimigo das mulheres!
Por verdade e justiça para Marielle e Anderson!
Pela vida das mulheres!

Tamo juntas até que todas sejamos livres!

 

*Co-presidenta da TamoJuntas

Dia de luta pelo Enfrentamento da Violência Contra a Mulher

Por Eunice Suelen; Nayara Bispo e Roseli Barbosa*

 

O dia 25 de Novembro é o dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra  Mulher no Brasil e no mundo. É um dia de ativismo para denunciar a violência contra a mulher e cobrar políticas eficazes de erradicação do fenômeno.

A convocação se iniciou através do movimento feminista latinoamericano em 1981 para marcar a data em que foram assassinadas as irmãs Mirabal na República Dominicana. Esta é uma data  importante para fazermos uma reflexão sobre a necessidade de olhar para as mulheres com respeito e não como objeto de pertencimento ao outro. É, sobretudo fortalecê-las para que as mesmas criem autonomia sobre suas vidas e construam uma vivência livre de violência.

Apesar dos avanços alcançados nos últimos anos através da criação de políticas públicas de proteção e enfrentamento à violência contra a mulher, em especial a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), o índice dos casos de violência ainda é bastante elevado na sociedade brasieliara.

O ano de 2020 está sendo considerado um ano de muita luta e resistência, sobretudo, por se tratar de um ano com especificidades peculiares complexas, acarretadas pela pandemia do Covid19, fator agravante para incidência de diversificadas formas de violências para muitas mulheres que antes mesmo desse momento histórico de pandemia já  se encontravam inseridas em contextos de violência.

O lar, espaço que deveria configurar um local de segurança para as mulheres, se tornou um lugar de maior vulnerabilidade, visto que na maioria dos casos, as mesmas dividem o mesmo ambiente com os algozes. No Estado da Bahia, no primeiro momento da pandemia os dados da Secretaria de Segurança Pública apontavam para a diminuição do índice de violência contra as mulheres, contradizendo o que apontava os dados do disque 180 o qual afirmava aumento dos casos. Isso significa que foi e é um processo marcado por um número expressivo de subnotificação, isto é: os casos não deixam de existir, mas deixam de ser notificados.

Atuar no fronte do enfrentamento a violência contra a mulher não é tarefa fácil. Embora, na TamoJuntas prestamos um atendimento pautado na perspectiva feminista utilizando princípios como acolhimento diferenciado embasado em sororidade, empatia, ausência de julgamento e etc., ainda assim não damos conta de atender todos as instâncias que as mulheres precisam para romper o ciclo da violência. Elas necessitam ser encaminhadas para outros núcleos da rede. Entretanto, não podemos perder de vista a predominância do patriarcado, machismo e misoginia na sociedade e que automaticamente vai refletir nas instituições públicas de atendimento as vítimas, as quais acabam sendo culpabilizadas e revitimizadas justamente por quem deveria acolher conforme preconiza a Lei Maria da Penha.

 

*Assistentes Sociais da TamoJuntas

 

Referência:

https://fasubra.org.br

https://g1.globo.com/

 

Dia da Mulher Negra Latina e Caribenha

Por *Eunice Suelen da Hora e Silve Elen Braga.

Através da construção social e histórica, o racismo que se manifesta de diversas formas e locais, atinge as mulheres negras nas diversas estruturas que fazem parte, pois a natureza das relações de dominação e subordinação que operavam na escravização, refletem até hoje nos diversos índices ocupado por elas. Essa diferença é percebida nas relações entre o sexo, nos altos índices de feminicídio e violência contra mulher, nos baixos índices de escolaridade, a falta de acesso à educação e alto indices de analfabetismo, subempregos entre outros, fortalecendo assim as relações de poder, na qual foi ensinada para as mulheres negras que são submissas e inferiores, negando o protagonismo da sua história numa sociedade tão desigual.

Sendo assim, ser mulher preta diante todas as desigualdades é carregar no nosso corpo saberes da Ancestralidade de todo um povo e (re)criar em todo amanhecer estratégias de sobrevivência para vencer o racismo, machismo e todas as formas de opressões. É ser resistência, luta, companheirismo, colo e sabedoria, cuidado com os seus e com os outros na sua caminhada.

Ser mulher preta é enfrentar os obstáculos impostos pela sociedade mostrando que somos capazes de realizar qualquer atividade e sermos donas do nosso destino, mesmo que muitos ainda não sejam capazes de reconhecer e legitimar as nossas conquistas diárias, que podem nos levar onde quisermos, pois estamos fortalecidas a todo momento em não parar de buscar conhecimentos e aprimorar nossas habilidades.

Por fim, ser mulher preta é sempre está em busca para acessar os diversos espaços que por muito tempo nos proibiram de adentrar, é se posicionar quando tentarem falar sobre nossas vivencias, nossas dores, nos fazendo entender que nossas falas não tinham importância alguma para a sociedade e para as classes dominantes na qual fomos a todo tempo invisibilidades e por esse motivo a luta se torna diária para conquistar e mostrar a importância do nosso lugar de fala.

Que nesse Julho das Pretas o colo das nossas ancestrais nos sirvam de afago e que seus ombros nos sirvam de apoio para continuarmos avançando na luta coletiva para nossa sobrevivência e nosso protagonismo, pois até aqui, já sabemos que somos donas do nosso próprio caminhar.

* Assistente Sociais

A Invisibilidade Social da Mulher Negra

Por *Roseli de Oliveira Barbosa

No Julho das Pretas, mês em que se comemora o dia Internacional da Mulher Negra, Latino-Americana e Caribenha é fundamental refletirmos a respeito das nossas lutas e resistência, enquanto mulher negra, frente às estruturas de poder que dificultam a nossa ascensão e ocupação dos espaços essenciais para a transformação social da nossa realidade.

Não podemos falar sobre os desafios contemporâneos enfrentados pelas mulheres negras, dissociados do processo de formação da sociedade brasileira,a qual se deu em um contexto de desumanização e exploração da população negra por meio da mão de obra escrava e mesmo após a suposta “libertação” a partir da assinatura da Lei Áurea, os nossos direitos seguiram sendo negados quando a nós não foi dada nenhuma possibilidade que permitisse construir uma realidade justa e igualitária a partir daquele momento.

A pirâmide social brasileira é em tese formada pelo homem branco, seguido da mulher branca, o homem negro e na base encontra-se a mulher negra. Ao observar essa realidade é perceptível que nós mulheres negras somos o grupo que mais sofre os impactos sociais ocasionados por uma estrutura de poder que é patriarcal, elitista, machista,misógina, racista e que atua na perspectiva de manter em curso as desigualdades sociais, de gênero e principalmente a desigualdade racial.

Ao longo da história as mulheres alcançaram através das suas lutas, importantes conquistas de direitos. Entretanto, vale lembrar que a abrangência desses direitos nem sempre englobaram todas as mulheres de forma unanime, sobretudo, em razão do marcador racial e de classe ainda presente na sociedade. O debate que envolve as demandas referentes às mulheres precisa ocorrer a partir de uma perspectiva interseccional que leve em consideração as especificidades peculiares de cada grupo de mulheres. Isso possibilita, por exemplo, que ao criar políticas públicas de atenção à mulher, sejam levadas em consideração as necessidades relacionadas às mulheres negras, que na maioria das vezes são diferentes das necessidades que envolvem as mulheres não negras.

No Brasil, ainda somos um grupo minoritário ocupando espaços na esfera política, se isso ocorre quem está discutindo as nossas pautas? Quais são os projetos que estão sendo criados a fim de atender as nossas necessidades? Alguém está falando por nós e certamente esse alguém não conhece as nossas dores porque nunca as sentiu. As mulheres negras precisam falar por si, precisamos ter espaços garantidos para romper o silenciamento a qual fomos submetidas historicamente, só assim poderemos relatar as nossas dores, expressar as nossas necessidades e exercer a nossa cidadania. Resistir ainda é a arma principal frente às estruturas promissoras das desigualdades e violações dos direitos das mulheres negras.


* Assistente Social

Combater o abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes é um dever de todos.

Voluntária Naiara Bispo (Assistente Social)

 

O dia 18 de maio é o dia Nacional do combate ao abuso e à exploração sexual contra crianças e adolescentes. A data foi escolhida devido ao “ Caso Araceli”, que ocorreu em Vitória (ES), em 18 de maio de 1973. Araceli era uma menina de 08 anos de idade, que foi raptada, estuprada e morta por jovens de classe média. Esse crime, até hoje está impune.

A data é importante para nos lembrar que assim como a família e o Estado, a sociedade também tem o dever de proteger de maneira integral a criança e o adolescente. A luta para combater o abuso e conscientizar as pessoas para que entendam que criança e adolescente são sujeitos de direito, é diária e árdua.

É de extrema importância tratar do assunto abertamente, tanto com crianças (de acordo com sua faixa etária), quanto com os adultos para que casos de assédio e exploração deixem de ser tratados como invenção da cabeça da criança. Vale lembrar que toda criança e adolescente tem direito ao desenvolvimento de sua sexualidade de forma segura, e nós enquanto sociedade temos que garantir esse direito.

Trabalhar a prevenção de forma intensificada em toda a sociedade é um grande passo para que crianças e adolescentes e a família aprendam a identificar, se defender e denunciar casos de abusos e assédios, que na sua maioria são cometidos por pessoas próximas (vizinhos, amigos e etc) e familiares( pai, tio, avô, irmão, primo e etc). Segundo dados do disque 100 mais de 70% dos casos de violência sexual contra criança e adolescente acontecem dentro de casa.

Ensinar as crianças a conhecerem seu próprio corpo e reconhecerem que há algo de errado quando alguém a toque de maneira constrangedora ou a exponha a cenas pornográficas, é uma maneira de prevenção. Lembrando que ao ensinar-lhes essa maneira de prevenção nós não estamos induzindo ao sexo, estamos na verdade encorajando-as a denunciar. E nós também devemos ficar atentas/os e nos tornar uma fonte de segurança para essa criança.

Preparar também professores para que consigam identificar através do comportamento dos alunos qualquer mudança e torna-los uma fonte segura para que as crianças possam denunciar, caso a família seja a agressora ou não consiga identificar o abuso.

Enfim, é um dever meu, seu e de todos nós, garantir que crianças e adolescentes não tenham seus direitos violados. Para realizar denúncia você pode ligar para o Disque 100, para o 190 ou pode entrar em contato com o Ministério Público do seu Estado e realizar a denúncia. Como diz uma Assistente Social e amiga, Lucy Luz: “ Toda criança é responsabilidade nossa.”

Reflexões sobre o 15 de maio: Ser Assistente Social… 

Ser Assistente Social no enfretamento a violência contra mulher é atuar na  perspectiva  de fortalecimento das mulheres para que elas criem autonomia sobre suas vidas, pensando  juntas  em uma forma de sair desse ciclo de violência em que se encontra.

É se sentir de mãos atadas quando isso não acontece e uma mulher que está no ciclo de violência acabe por retornar a se relacionar com seus agressores.

A violência contra a mulher decorre de uma desigualdade existente entre homens e mulheres, nessa sociedade machista, onde a mulher ainda é considerada um objeto de desejo e luxo, muitas vezes sendo submissa e sem força para lutar pelos seus objetivos.

Atinge mulheres em todas as esferas sociais, e traz um medo que produz na mulher uma baixo autoestima, vergonha, fazendo-se necessário criar estratégias de enfrentamento desse problema. Através da escuta, socialização de informações sobre seus direitos, sem julgamentos e com muito respeito,  contribuímos no alívio de angústias e no fortalecimento das mulheres.

Precisamos sempre lutar por uma sociedade que entenda a complexidade da violência contra mulher, e onde os profissionais trabalhem de forma integral e articulada, para suprir as reais necessidades. Sejam ela o estímulo da denúncia, orientações a cada passo, realização de dinâmicas e encontros que busquem resgatar a autoestima ou na luta por políticas que busquem alternativas e possibilidades de intervenção junto as demandas apresentadas.

Mas, por outro lado nos sentimos heroínas ( sem capa), quando acompanhamos a evolução de uma mulher que consegue romper o ciclo e se reerguer, e a felicidade nos consome ao saber que nossa orientação contribuiu para essa evolução.

É se reinventar a cada demanda que nos chegam, a sair e retirar principalmente as nossas assistidas da suposta zona de conforto, fazendo com o que enxerguem sua realidade, para não desistir e seguir em frente.

O momento que vivemos é um momento pleno de desafios. Mais do que nunca, é preciso ter coragem, é preciso ter esperanças para enfrentar o presente. É preciso resistir e sonhar. É necessário alimentar os sonhos e concretiza-los dia a dia,  nos horizontes de novos tempos mais humanos, mais justos, mais solidários. (IAMAMOTO, 2004).

 

Autoria – Voluntárias Assistente Sociais TMJ: Eunice Suelen da Hora; Naiara Bispo; Silve Elen Braga e Vanessa Brito

Nossa história recontada por nós: Viva Zumbi! Viva Palmares! Aqualtune? Quem é essa?

Por Laina Crisóstomo

Toda história da civilização é contada pelos homens, com os homens e para fortalecer os homens, mas onde estamos nós nas nossas próprias histórias?

Quero falar nesse texto de uma mulher negra incrível como muitas de nós que teve por anos sua história de luta, resistência omitida com o único objetivo de nos fazer desacreditar de nosso poder, conhecimento e capacidade de mudar o mundo, ela é Aqualtune. Quem é ela? Se eu disser que ela é avó de Zumbi todo mundo dirá: Ah! Por que não disse isso antes? Porque não quero dizer isso, não quero mais uma vez contar a história de uma mulher a partir de um homem, quero falar dela, por ela, para ela e com ela.

Aqualtune é uma mulher negra oriunda do Continente Africano, era princesa no Congo. Em 1665 liderou a Batalha de Mbwila entre o Reino do Congo e Portugal, quando após a derrota foi capturada, aprisionada e trazida para o Brasil e vendida como escrava reprodutora. Conta a história que Aqualtune comandou um exercito com 10 mil homens a fim de combater a invasão de seu reino, mas infelizmente não teve êxito.

Ela foi negociada para ser escrava reprodutora, afinal era grande, forte e de ancas largas (boa para parir), mas como era guerreira se revoltou e fugiu para participar da consolidação de Palmares. Como princesa e comandante do exercito no Congo ela tinha muitos conhecimentos políticos, organizacionais e de estratégia de guerra mesmo o que foi, sem dúvidas, fundamental para a República de Palmares.

Entretanto por que falar sobre isso no site da TamoJuntas? Primeiro porque é Julho das Pretas e precisamos conhecer nossas histórias porque representatividade importa muito e segundo porque o texto não acabou e quero trazer uma reflexão sobre violência obstétrica.

O que Aqualtune tem que ver com Violência Obstétrica, Laina? TUDO. Ela foi vendida como escrava reprodutora, mas por quê? Pelos motivos que já mencionei em dois parágrafos acima, sim, mas e ai? Hoje quem são a mulheres que mais sofrem por mortalidade materna e violência obstétrica no Brasil? Bingo, mulheres negras e por quê? Por possuírem as mesmas características que Aqualtune.

Então estamos dizendo que existe racismo no sistema de saúde? Lógico e a perversidade como ele se mantém, se dissemina e aumenta o número de adeptos é assustadora. Os números oficiais falam que 62,8% das vitimas de mortalidade materna são mulheres negras, 65,9% das mulheres que sofrem violência obstétrica são negras, isso quer nos dizer algo, quer denunciar que desde o século 17 nada mudou, mesmo com leis, planos, pactos, políticas públicas, o racismo permanece entranhado nas instituições e nos matando cada dia de uma forma!

Mulheres negras sofrem com o mito de que “são fortes e aguentam a dor” e por isso normalmente não recebem anestesia, poucas conseguem ser acompanhadas no parto (aproximadamente 27%). Mulheres negras e brancas numa mesma comunidade periférica tendem a ter atendimentos diferenciados, mulheres brancas são atendidas por mais tempo, em razão do outro mito também do período da escravidão de que eram frágeis e delicadas necessitando assim de cuidados especiais.

Mulheres negras sofrem violações todos os dias, inclusive de mulheres brancas, que estejamos atentas não somente no Julho das Pretas ou no Novembro Negro, mas todo o ano, afinal 500 anos de escravização não muda mentes da noite para dia, é preciso lutar todos os dias!

Por que continuamos com nossos companheiros em relacionamentos abusivos?

Por Laura Augusta

Existe um mito que cerceia a afetividade das mulheres, quando tocamos no assunto da violência de gênero e da construção das afetividades, que é a manutenção e permanência desse relacionamento, ou seja, quando mesmo sabendo dos riscos de aumento de intensidade de violência e de feminicídio, a decisão tomada pela mulher é a de permanência no seu relacionamento, seja por ‘x’ motivos. Ao senso comum, com poucas exceções, a mulher alimenta o comportamento misógino daquele agressor, logo, apanha porque gosta.

Porém, colocando a deixa á ciência que muito contribuiu através de anos sendo omissa, fomentando a desigualdade de gênero e a misoginia em diversas vertentes como o Direito, Psicologia, Serviço Social, Medicina e etc, quando observamos esses fenômenos de uma perspectiva sócio-histórica e interseccional, podemos perceber a emergência de alguns fatores que não podem ficar em silêncio.

Quando convido a reflexão por essa vertente, quero dizer que historicamente no nosso país que foi colônia de exploração de Portugal, teve suas riquezas extraídas para alimentar o império europeu, a mulher é sempre objetificada em seu espaço de adorno. Seja o adorno que embeleza a casa ou aquele que presta o serviço para que a casa continue embelezada. O lugar da mulher, socialmente representado, sempre foi de objeto. E até hoje, grande parte da população brasileira revive e vive re-vitimizada desse lugar social. Partindo aqui a segunda parte do convite, quando focalizo interseccionalmente, explicando que a maioria da população brasileira é negra e feminina.

Conjugando essas opressões e crescendo numa sociedade que alimenta a estrutura das mesmas através de estereótipos de masculinidades que promovem o fenômeno da violência, este que bebe de uma origem escravocrata, é muito complicado se olhar no espelho e enxergar-se vítima, com paradigmas como o da meritocracia e da democracia racial, tão fortalecidos, gritando que as mulheres, principalmente negras e pobres, precisam ser mais esforçadas e que todos somos iguais.

Quando afirmo este lugar de mulher negra pobre e periférica, não anulo as violência das outras mulheres. Afirmo estas e apresento os privilégios sociais que aprisionam a maioria da população brasileira em situação de vulnerabilidade. O que violência de Gênero tem a ver com concentração de renda, com pertencimento racial e sofrimentos difusos? Simples. Se temos em um país rico como o Brasil, onde os 5% mais ricos detêm 28% da renda total e da riqueza, sendo estes homens brancos, a representatividade econômica realiza sua exclusão de raça e gênero. Sendo assim direitos trabalhistas de igualdade, garantia de direitos adquiridos e eficácia das leis que protegem mulheres em profissões que são majoritariamente femininas ficam sempre no limbo do critério de quem irá exercer a justiça. Se ha maior concentração de renda nas maos de homens brancos e suas familias, sabemos que a desigualdade tem nome, sobrenome e endereço certo. E que na hierarquia das opressões, as que irão ficar desassistidas nessa história, desde sempre : As mulheres negras.

Essa desassistência que atravessa a diáspora e se estrutura em terras estranhas, se arrastando por anos em lacunas de lutos mal elaborados, de depressões não permitidas, de mudança de nome, de colonização e das negações que essa estrutura promove, as afetividades são construídas assim. Da negação e da necessidade. A necessidade primária pode ser a comida na mesa e a escola, a saúde, a segurança pública que é dever do estado,que não teve acesso. Porém, para além disso, está a infância construída nas referências do trabalho escravo, a rede de apoio de amigos e amigas, se perdendo aos poucos todos os dias pela violência policial e pelas outras diversas ações do plano genocida. Está na forma que as relações são construídas nesse cenário, a maternidade, as relações afetivas e as formas de educar os filhos. A maneira que demonstra-se afeto em família e até mesmo, o que seria família.

Cada passo dado em busca das respostas para esse fenômeno são feridas abertas que encontramos e que todos afirmam que elas existem e estão gravemente expostas, porém pouquíssimas pessoas,e instituições se debruçam a cuidá-las. Temos no Brasil, a cultura de prevenirmos de doenças epidêmicas porém não construímos hábitos de promoção de saúde. Temos leis que combatem a violência de gênero em sua instância física e no assassinato, Porém, falar sobre como chegamos aqui e construir caminhos para que o ciclo reordene seus passos para fora da violência é algo raro e que precisa ser pensado com urgência.

Esse texto, apesar de carregar em seu título uma prerrogativa de resposta, não responde esses fatos. Afinal, dentro desse contexto bizarro que fomos educados, muito difícil ( e cada mulher negra que combate contra a misoginia na luta antirracista sabe) sair ileso desse tiroteio de opressões. Os relacionamentos abusivos que se mantém por motivos inúmeros, podem ser como band-aids para úlceras. Não resolvem o problema, denunciam que a ferida é gigantesca, porém o processo de cuidado é sempre pautado no princípio bioético de autonomia. Porém é possível ter autonomia, diante de todo o contexto trazido nas linhas acima? Continuemos em luta.

Dar-se valor – Uma narrativa honesta sobre auto-estima, sororidade e identidade feminina negra numa construção racista.

Por Laura Augusta

Escrever nem sempre é uma tarefa fácil, principalmente quando existe um universo de situações e pessoas criticando, sem sugestões, o processo de construção textual. Quando estamos aprendendo algo e alguém nos diz que estamos no caminho errado, sem sugestões de melhora, com várias portas fechadas é realmente muito difícil estar segura e até mesmo falar sobre o ‘não conseguir’ construir um texto sozinha . Esse é um exemplo cotidiano no mundo de milhares de mulheres negras que gostariam muito de se expressar textualmente sobre seus sentimentos, mas assim como são os textos, são as dores, as experiências, o conforto, respeito e a vida dessas pessoas.

A nossa auto-estima é construída na relação com outro e para nós que estivemos sempre no lugar de negação, tudo é questionado. Nossa capacidade intelectual, nossa beleza, nossa história, nosso pertencimento religioso, as histórias das nossas mães, avós , tias. Nossas indumentárias. Tudo é passível de questionamento. E crescer negra e mulher numa sociedade que tudo questiona é sofrer psiquicamente todos os dias os danos ancestrais do não lugar no mundo, no mercado de trabalho, na vida das pessoas, nas experiências afetivas e por fim reviver violências e ser conduzida a achar natural tudo isso.

Quando o feminismo surge e coloca em pauta as relações de gênero, fazendo emergir a palavra sororidade que se tornou um boom nas redes sociais e nas conversas militantes no combate ao machismo, tudo se tornava tão longe de nós, pois as nossas feridas são tão profundas e tão velhas que fica difícil dialogar sobre voto e trabalho num nível tão desonesto e sem equidade que ficamos realmente distantes em tudo. E toda proposta de possível afetividade entre mulheres nunca será justa enquanto não colocarmos na balança dos privilégios quem sofre e quem sempre sofreu mais. Então escrever, falar,aprender, se relacionar, construir uma carreira firme ou o primeiro emprego, tudo isso é muito injusto quando colocamos na mesa a falácia dos méritos.

Se observarmos com uma lupa racial quem majoritariamente ocupa os trabalhos de prestação de serviço de base iremos ver a nossa cara estampada obrigatoriamente nesse espaço, pois socialmente esses são apenas os espaços que nos esperam. Logo, para se mover socialmente na pirâmide do capital, requer muita energia pra enfrentar essas galinhas pulando todos os dias. E essa energia é saúde, é desgaste que são potenciais fatores para os adoecimentos que já conhecemos nas histórias de nossas mães, avós, tias e que acabamos herdando geneticamente.

O ‘se dar valor’ aqui, quando colocamos no papel, quando expressamos a nossa história, nossos sonhos e desejos seja pela voz, pela dança, pelo olhar, pela reatividade, tem um outro sentido. Se dar valor aqui, não significa se recatar ou se padronizar ao silêncio que se espera de nós, dar-se valor aqui não significa uma cobrança como se o valor fosse como um preço. O valor aqui é uma lembrança, uma memória de Dandara, Akotirene, Maria Felipa e de tantas que a história silenciou, mas deixaram para nós a riqueza sem preço das estratégias de luta, sobrevivência e principalmente vitória. Se dar valor aqui significa não aceitar nenhum dialogo sobre nós como recorte, sabendo que somos a maioria da população brasileira.  A caminhada tem sido de muitos calos, de muitos furtos, muitas pedras no meio da estrada, mas a cada encruzilhada encontramos um potente motivo para continuar caminhando, no encontro do caminhar das outras e ensinando as que estão vindo a andar, sem romantismo, mas com muito afeto.

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