Dia de luta pelo Enfrentamento da Violência Contra a Mulher

Por Eunice Suelen; Nayara Bispo e Roseli Barbosa*

 

O dia 25 de Novembro é o dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra  Mulher no Brasil e no mundo. É um dia de ativismo para denunciar a violência contra a mulher e cobrar políticas eficazes de erradicação do fenômeno.

A convocação se iniciou através do movimento feminista latinoamericano em 1981 para marcar a data em que foram assassinadas as irmãs Mirabal na República Dominicana. Esta é uma data  importante para fazermos uma reflexão sobre a necessidade de olhar para as mulheres com respeito e não como objeto de pertencimento ao outro. É, sobretudo fortalecê-las para que as mesmas criem autonomia sobre suas vidas e construam uma vivência livre de violência.

Apesar dos avanços alcançados nos últimos anos através da criação de políticas públicas de proteção e enfrentamento à violência contra a mulher, em especial a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), o índice dos casos de violência ainda é bastante elevado na sociedade brasieliara.

O ano de 2020 está sendo considerado um ano de muita luta e resistência, sobretudo, por se tratar de um ano com especificidades peculiares complexas, acarretadas pela pandemia do Covid19, fator agravante para incidência de diversificadas formas de violências para muitas mulheres que antes mesmo desse momento histórico de pandemia já  se encontravam inseridas em contextos de violência.

O lar, espaço que deveria configurar um local de segurança para as mulheres, se tornou um lugar de maior vulnerabilidade, visto que na maioria dos casos, as mesmas dividem o mesmo ambiente com os algozes. No Estado da Bahia, no primeiro momento da pandemia os dados da Secretaria de Segurança Pública apontavam para a diminuição do índice de violência contra as mulheres, contradizendo o que apontava os dados do disque 180 o qual afirmava aumento dos casos. Isso significa que foi e é um processo marcado por um número expressivo de subnotificação, isto é: os casos não deixam de existir, mas deixam de ser notificados.

Atuar no fronte do enfrentamento a violência contra a mulher não é tarefa fácil. Embora, na TamoJuntas prestamos um atendimento pautado na perspectiva feminista utilizando princípios como acolhimento diferenciado embasado em sororidade, empatia, ausência de julgamento e etc., ainda assim não damos conta de atender todos as instâncias que as mulheres precisam para romper o ciclo da violência. Elas necessitam ser encaminhadas para outros núcleos da rede. Entretanto, não podemos perder de vista a predominância do patriarcado, machismo e misoginia na sociedade e que automaticamente vai refletir nas instituições públicas de atendimento as vítimas, as quais acabam sendo culpabilizadas e revitimizadas justamente por quem deveria acolher conforme preconiza a Lei Maria da Penha.

 

*Assistentes Sociais da TamoJuntas

 

Referência:

https://fasubra.org.br

https://g1.globo.com/

 

Meninas relatam castigos e homofobia em centro de detenção, diz relatório

Meninas adolescentes denunciaram a entidades de direitos humanos que estão sendo castigadas, punidas de forma cruel, isoladas e sendo vítimas de preconceito por homofobia no Centro Socioeducativo Aldaci Barbosa Mota, em Fortaleza, que abriga 33 adolescentes que cometeram algum tipo de infração —72% delas são negras.

Um relatório com as denúncias foi produzido após uma visita ao local, administrado pelo governo do estado do Ceará, feita por representantes do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos, do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente e do Fórum Cearense de Mulheres no último dia 25 de setembro. O objetivo do centro seria atender as meninas em suas necessidades básicas durante o período de internação, enquanto cumprem a medida socioeducativa, até a reinserção delas ao convívio familiar.

Segundo o relato das adolescentes, seria cotidiana a prática dos socioeducadores de algemá-las nas grades dos dormitórios e do refeitório durante a noite e a madrugada. A prática, dizem, seria utilizada como uma sanção para aquelas que teriam batido na grade ou que teriam gritado para solicitar algum tipo de atendimento. “Em todos os relatos apresentados, os socioeducadores identificados como responsáveis por tal ação eram do sexo masculino. Pelos relatos, as adolescentes ficariam algemadas durante três a quatro horas por dia, e algumas afirmaram que os socioeducadores puxavam os seus cabelos nessas ocasiões”, diz o documento

“Essa prática é ilegal, fere a dignidade das adolescentes, conforme dispõe o artigo 18 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Ademais, a Súmula Vinculante nº 11 do Supremo Tribunal Federal (STF) estabelece que: Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito”, informa o relatório

Outro relato feito pelas adolescentes foi um episódio em que socioeducadores —novamente homens— teriam entrado no dormitório e colocado as adolescentes no chão do banheiro e as teriam agredido, pisando em seus corpos. “Uma adolescente chegou a mencionar que um socioeducador havia afirmado que iria ‘apagar’ ela. Outra jovem contou que um socioeducador falou que ‘ia trabalhar pra ela morrer e ser enterrada ali na unidade'”, diz o documento, que foi encaminhado para o Ministério Público, que poderá ingressar com futuras ações.

 

“Tranca” e “cabrões”.

 

No centro, as jovens relatam que passaram pelo dormitório “tranca”, uma espécie de solitária dentro da unidade. “Mais da metade dos grupos focais, 64%, apresentaram relatos de que as adolescentes receberam a sanção de isolamento forçado no dormitório tranca”, aponta. As questões de homoafetividade também são punidas dentro da unidade, segundo relatos das jovens. Segundo elas, o tratamento dos socioeducadores com as adolescentes LGBT é diferenciado, com características de violência e agressividade. Existem alojamentos destinados às adolescentes LGBT, também denominadas pelos profissionais da instituição de “cabrões.”.

“As meninas LGBT informaram que sofrem restrições de acesso a atividades e ao momento de lazer, e que recebiam ‘punição’ por demonstração de afeto. Apontou-se, nesse sentido, uma discriminação de gênero que é revelada a partir do disciplinamento dos corpos e da divisão do convívio das adolescentes, com o reforço ao estereótipo da mulher LGBT”, diz o documento

Nas nove recomendações do relatório, as entidades pedem, entre outras coisas, que seja abolido o uso de algemas, que haja o fechamento dos locais destinados ao isolamento com a finalidade do castigo e que os temas de igualdade étnico-racial, de gênero e de orientação sexual sejam tratados como “parte integral do atendimento socioeducativo”

 

Meninas têm histórico de negação de direitos

 

Segundo a presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos do Ceará, Cristiane Faustino, a condição encontrada no centro é preocupante, mas não surpreende.

“A situação desses locais de socioeducação, como as de presídios, são bastante públicas, notórias. Na verdade, só vai surpreender quando acharmos algo diferente disso”, diz

Dos pontos encontrados, ela destaca os castigos s com algo muito grave. “Temos pessoas sendo algemadas e sofrendo sanções. Como é que agentes públicos fazem o trabalho desse jeito com adolescentes? Isso levanta a questão: como eles estão sendo selecionados e treinados para esse serviço? Claro que não é um trabalho fácil, mas a prática de tortura não se justifica”, diz.

Outra questão que chamou a atenção é o fato de que a maioria dos agentes eram homens. “Isso não é uma coisa recomendada. A gente sabe que a violência sexual é uma realidade grave, e isso se torna uma situação de muito risco quando se trata de meninas jovens”, afirma.

Para ela, uma das marcas das adolescentes internadas no local é a da exclusão social. “Se você puxar a linha do passado dessas meninas, vai encontrar uma história de negação de direitos e de reconhecimento. É preciso sempre levar em conta o contexto. E o que nós, como sociedade, temos feito com essas pessoas? O que fazemos para reduzir essa sociedade tão desigual e desumana? A gente precisa romper a barreira do não reconhecimento, rever nossos métodos socioeducativos. Eles não estão dando o resultado, há muita violência”, avalia Cristiane

Outro lado

Procurada por Universa, a Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo do Ceará, responsável pelo Centro Socioeducativo Aldaci Barbosa Mota, afirmou que o centro inspecionado não conta com os espaços de isolamento descritos no relatório.

“A unidade é referência no atendimento socioeducativo, sem possuir histórico de situações de crise ou violação de direitos ao longo de sua trajetória”, diz a nota da superintendência.

Ainda segundo a superintendência, a unidade é destaque por “metodologias e práticas socioeducativas que são exemplos de trabalho positivo” com adolescentes, que foram “premiadas no concurso de redação da Defensoria Pública da União.”

Sobre o uso das algemas, a unidade diz que há previsão legal e regulamentada por portaria de segurança para sua utilização. “O instrumento é utilizado apenas em casos excepcionais, devidamente registrados em livro de ocorrências, tendo respaldo na Lei do Sistema Nacional de Socioeducação e no Estatuto da Criança e do Adolescentes (ECA), bem como seguindo as orientações da Súmula Vinculante nº 11 do Supremo Tribunal Federal”.

Com relação às questões de discriminação, a superintendência afirma que não há relatos de violações ou discriminações com relação à orientação sexual e que “mantém articulação com órgãos estaduais e municipais e com as universidades para a construção de uma Portaria para reforçar o atendimento humanizado e adequado para estas adolescentes.”

O órgão afirma ainda que todas as denúncias de violação de direitos humanos são investigadas. Desde a criação da corregedoria da superintendência, em 2016, foram instaurados 212 procedimentos administrativos ou sindicâncias em todas as unidades, “que variam entre denúncias de agressões/maus tratos sofridos pelos adolescentes, faltas e/ou ausências injustificadas, negligência ou omissão de condutas e inadequação às rotinas estabelecidas nas unidades socioeducativas, havendo sempre responsabilização no caso de comprovação de práticas inadequadas”

 

Matéria reproduzida de Uol.com.br/Universa

‘Estupro culposo’: Sentença evidencia ótica da cultura misógina e naturaliza violência sexual

A sentença de “estupro culposo” que absolveu o empresário André de Camargo Aranha da acusação de violência sexual contra a promotora de eventos Mariana Ferrer, de 23 anos, abre um precedente perigoso e violento que reforça a cultura do estupro no país. Essa é a avaliação da advogada Letícia Ferreira, que há quatro anos integra a equipe do coletivo “TamoJuntas”, que presta serviço jurídico, psicológico e social gratuito para mulheres vítimas de violência. A organização feminista é composta por profissionais de diversas áreas que atuam voluntariamente na assistência multidisciplinar a mulheres em situação de violência. O “TamoJuntas” possui voluntárias em diversas regiões do Brasil.

A advogada acredita que a decisão do juiz Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, responsável pelo caso, mostra como a cultura do estupro está disseminada e inclusive se perpetua na não responsabilização dos agressores e na dificuldade que as mulheres tem em responsabilizá-los pelo crime.

“Até porque elas são tratadas com uma conduta suspeita, aproveitadoras, mentirosas, ou como mulheres cujo comportamento facilitaria o crime. Então são diversas justificativas que, na verdade, só vem confirmar que vivemos todas as esferas da sociedade sob a ótica e a perspectiva de uma cultura misógina e que reforça e naturaliza a violência sexual”, argumenta Letícia Ferreira.

Imagens da audiência do caso de estupro de Mari Ferrer foram divulgadas pelo The Intercept Brasil nesta terça-feira (3) (veja aqui). Os trechos divulgados repercutiram, causaram revolta e deixaram o assunto entre os assuntos mais comentados nas redes sociais. Na ocasião, o empresário André de Camargo Aranha era julgado pelo estupro da jovem em uma festa que ocorreu em 2018. No entendimento no promotor do caso, não havia como Aranha saber, durante o ato sexual, que a vítima não estava em condições de consentir a relação, não existindo assim “intenção” de estuprar.

Na visão de Letícia, a audiência mostra falhas e a violência reforçada pelo poder judiciário em julgamentos do tipo.

“Ele culpabiliza o comportamento da vítima e naturaliza o comportamento do agressor”, ressalta. Ela ainda acrescenta que no caso Ferrer as provas incluíam elementos que confirmavam o relato da promotora de eventos, e mesmo assim o relato foram desconsiderados. “As provas materiais são menosprezadas em virtude de absolver o agressor”, afirmou.

A tese apresentada pelo promotor e acatada pelo juiz, todos homens, não tem precedentes na Justiça brasileira. Exatamente a inexistência de um crime não previsto em lei é que embasou o argumento e acabou em absolvição do empresário.

“Chocante. A sentença traz uma postura inovadora. Traz a figura do estupro culposo, e a absolvição com base em não existir o estupro culposo. De fato, não existe um modo culposo de estupro”, reconheceu. Em seguida ela explica que o estupro é a violência sexual, qualquer ato sexual feito sobre grave ameaça. No caso de Mari Ferrer a tipificação deveria ser, e foi a princípio, como estupro de vulnerável, em que a vítima não tinha condição de dar o seu consentimento.

No vídeo a que o The Intercept teve acesso, o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho, contratado por André de Camargo Aranha para defendê-lo, ataca a vítima e utiliza fotos de Mariana fora de contexto. Ele apresenta fotos sensuais dela e chega a classificar as imagens como “ginecológicas”. Em momento algum foi questionado por membros do Tribunal de Justiça catarinense sobre a relação das fotos com o caso. Em outro momento da audiência, o advogado de Aranha afirma que “jamais teria uma filha” do “nível” de Mariana. Ele também repreende o choro dela: “não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo”.

Em outro momento, o advogado insinua que Mariana tem como “ganha pão” a “desgraça dos outros”.

A conduta de Gastão se mostra como “um evidente abuso do poder de defesa” para a advogada baiana. “O advogado do agressor é extremamente violento, misógino, e acaba por violentar a vítima. E dá para perceber no vídeo que aquela situação é consentida inclusive pelo juiz”, lamenta.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vai analisar um pedido de investigação contra o juiz Rudson Marcos que inocentou o empresário. O pedido de investigação contra o magistrado foi apresentado pelo conselheiro do CNJ Henrique Ávila à corregedoria do órgão. Ávila quer que sejam averiguadas responsabilidades do magistrado na condução da audiência por meio da abertura de uma reclamação disciplinar. A proposta deve ser apreciada pelo plenário do Conselho.

O plenário do Senado Federal aprovou nesta terça-feira, por unanimidade, voto de repúdio ao promotor Thiago Carriço, ao advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho e ao juiz Rudson Marcos por causa do caso de humilhação a Mariana Ferrer.

O voto foi apresentado pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que também entrou com representação contra o juiz do caso no CNJ e contra o promotor no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O mesmo será feito contra o advogado do caso na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, utilizou as redes sociais para criticar a sentença. “As cenas da audiência de Mariana Ferrer são estarrecedoras”, escreveu o ministro.  “O sistema de Justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação. Os órgãos de correição devem apurar a responsabilidade dos agentes envolvidos, inclusive daqueles que se omitiram”, defende Gilmar

O caso repercutiu também entre famosos. A atriz Bruna Marquezine publicou a matéria do caso e lamentou. “‘Estupro culposo’, pqp”, escreveu. Enquanto a cantora Iza afirmou que “’Estupro culposo’ não existe”. A atriz Deborah Secco usou as redes sociais para pedir “Justiça por Mariana Ferrer”. Anitta usou o Twitter para mandar uma mensagem para a vítima: “Mariana Ferrer, eu admiro sua coragem de uma forma que você nem imagina”.

 

Matéria originalmente publicada no BahiaNoticias*

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