Chegou ao fim a batalha judicial de 14 anos entre Maria Luiza da Silva, de 59 anos, e a FAB (Força Aérea Brasileira). O STJ (Superior Tribunal de Justiça) negou recurso da União e reconheceu discriminação na aposentadoria compulsória a qual foi submetida no início dos anos 2000. Ela é a primeira mulher transexual da FAB e foi reformada por ser considerada “incapaz”.
A decisão do dia 23 de maio foi divulgada hoje pelo STJ. Assinada pelo ministro Herman Benjamin, documento diz que Maria Luiza tem o direito de se aposentar no último posto da carreira militar no quadro de Praças, o de subtenente “pois lhe foi tirado o direito de progredir na carreira devido a um ato administrativo ilegal, nulo, baseado em irrefutável discriminação.”
″É legítimo que a agravada receba a aposentadoria integral no posto de subtenente, pois lhe foi tirado o direito de progredir na carreira devido a um ato administrativo ilegal, nulo, baseado em irrefutável discriminação. Não há dúvida, assim, de que a agravante foi prejudicada em sua vida profissional por causa da transexualidade”, afirmou o ministro.
Ficou determinado que a militar deve permanecer no imóvel funcional da FAB que ocupa atualmente, localizado no Cruzeiro Novo, região do Distrito Federal, até que seja implantada a aposentadoria integral determinada em decisão.
Em fevereiro deste ano, o ministro já havia concedido medida cautelar para que a militar permanecesse no imóvel até a decisão final sobre sua aposentadoria. Em razão da notícia de que o Comando da Aeronáutica estaria descumprindo a decisão e exigindo que a militar arcasse com multas por prosseguir no imóvel, o relator também determinou a suspensão dessa cobrança e a devolução integral dos valores já descontados.
Decisão é considerada histórica. Em 2000, quando ainda era era cabo da Aeronáutica, Maria Luiza realizou a cirurgia de redesignação sexual, mas também recebeu o parecer do Alto Comando, que a diagnosticou como “incapaz, definitivamente, para o serviço militar”, mas “não inválido, incapacitado total ou permanentemente para qualquer trabalho”.
A justificativa teve como base o artigo 108, do Estatuto dos Militares, que estabelece como hipótese de incapacidade definitiva e permanente para os integrantes das Forças Armadas “acidente ou doença, moléstia ou enfermidade sem relação de causa e efeito com o serviço militar.”
Mas Maria Luiza não estava doente ou tinha sofrido algum acidente e sua batalha na Justiça por 20 anos ganhou documentário homônimo do cineasta brasiliense Marcelo Díaz, que estreou em festivais pelo País no ano passado.
“Queria tirar a Maria Luiza de dentro de mim, parar de escondê-la. Tinha a esperança de ser aceita pela FAB, de usar a farda feminina. Então, procurei os médicos da Aeronáutica para comunicar minha decisão. Eles ficaram surpresos. Por dois anos, fui impedida de trabalhar. Sofri ameaças e maus-tratos”, contou
“Eu me senti péssima quando fui obrigada a me afastar. Foi horrível saber que não poderia vestir minha farda nem exercer minhas funções. Quem ama o que faz e é obrigado a parar sofre”, disse.
matéria originalmente publicado em huffpostbrasil